sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Tiroteio no "pacificado" Alemão deixa militar ferido. Governo se apressa em dizer que homicídios na região caíram de 121 para 110.

Não,não é uma piada. O governo acredita que, com números mostrando essa "expressiva" queda de homicídios, ele vai convencer a população que todo o fuzuê em torno da pacificação valeu a pena.


Um confronto armado entre militares do Exército e criminosos do Complexo do Alemão na noite de ontem (24) deixou um soldado ferido. Segundo o coronel Malbatan Leal, chefe de comunicação da Força de Pacificação que atua na comunidade, o militar foi encaminhado ao Hospital Central do Exército, sem gravidade.

De acordo com o coronel, o tiroteio ocorreu por volta das 22h30, quando militares patrulhavam uma área conhecida como Pedra do Sapo. Na versão do Exército, criminosos avistaram os soldados e atiraram contra eles. Os militares, então, reagiram.

Segundo Malbatan Leal, o grupo que atacou os militares tinha entre cinco e sete criminosos armados, provavelmente, com pistolas e fuzis. O confronto comprova a existência de criminosos atuando com armas longas dentro do Complexo do Alemão – área considerada “pacificada” pelo governo do Rio. Há um ano o Exército ocupa a comunidade.

“Vamos continuar patrulhando a área como um todo, ocupando todo o espaço, sob nossa responsabilidade. Não diria que há bolsões controlados por criminosos. Há, sim, cada vez menos espaços onde eles têm liberdade para atuar, por isso entra a possibilidade de encontro. Nosso trabalho continua de forma intensa e com inteligência”, disse o coronel.

Esse é só mais um episódio de violência envolvendo o “pacificado” Complexo do Alemão, nesses doze meses em que o Exército ocupa a área, preparando terreno para a instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Em setembro deste ano, um grande tiroteio (que mais lembra a invasão do Iraque) atingiu o conjunto de favelas. E vários casos de homicídios, roubos e presença de homens armados atingiram o complexo nesse primeiro ano de ocupação.

Nem vou repetir aqui o quanto eu alertei, meses atrás, sobre os desafios que envolviam uma ocupação de longo prazo na comunidade.

Tampouco vou repetir aqui, que o Complexo do Alemão não está nem perto de ser pacificado, assim como algumas das favelas ocupadas por UPPs no Rio de Janeiro.

O que gostaria de destacar aqui é que, no mesmo dia em que o tiroteio acontece, ameaçando borrar a “festa” e a “fanfarra” pelo PRIMEIRO ANO de ocupação do Alemão pelo Exército, o Instituto de Segurança Pública (ISP) apressou-se em divulgar estatísticas, para, teoricamente, “comprovar” que a “pacificação” do Alemão está funcionando.

Abaixo, reproduzo os dados divulgados hoje pelo ISP, para tentar jogar uma cortina de fumaça na realidade e dar um upgrade no 1o aniversário da ocupação:

Área da 22a Delegacia de Polícia (que atende a 90% do Alemão)
No período de um ano antes da ocupação – 50 homicídios e 2 latrocínios
No período de um ano depois da ocupação – 43 homicídios e 2 latrocínios

Uau!!! Realmente dá para ver que houve mesmo uma “expressiva” queda nos homicídios da área do Alemão. Eram 50 e agora são apenas... 43. Isso... Apenas 43 homicídios em um ano.

Área do 16o Batalhão de Polícia (que inclui a 22a e a 38a DP) e área da 44a DP (que corresponde ao restante do Alemão).
No período de um ano antes da ocupação – 121 homicídios e 10 latrocínios
No período de um depois da ocupação – 110 homicídios e 6 latrocínios

É... Realmente eu me sentiria mais seguro num lugar pacificado, onde, antes aconteciam 121 assassinatos, e hoje, devido ao “grande” esforço do governo, só acontecem 110 assassinatos. É quase uma Suíça, mesmo, para parafrasear nosso secretário de Segurança.

É claro que o ISP divulga também que os roubos caíram na faixa de 30% a 40%. Mas, se um Instituto pode manipular estatísticas envolvendo mortes, que têm notificação obrigatória, por que não mexer em registros de roubos, que se contam aos milhares na região?

Bom, se você está satisfeito com uma pacificação que, depois de um exagerado carnaval e de extrema publicidade, reduz de 121 para 110 o número de homicídios, aplauda a “política” de segurança do governo do estado. Caso você ache esses resultados muito mixurucas, indigne-se, mostre sua insatisfação, interpele o governador e o secretário nas ruas, mande cartas para as TVs e os jornais. Exija resultados mais concretos e contundentes. Peça mais segurança para a sua rua.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Ministério da Justiça e Fórum de Segurança se rendem ao blog Rio .40 e reconhecem problemas nas estatísticas de criminalidade do Rio de Janeiro

Desde que percebi as supostas quedas milagrosas no número de homicídios do estado do Rio de Janeiro, no segundo semestre de 2009 (fenômeno que vem se repetindo, mês após mês, por dois anos), mostrei ceticismo quanto à qualidade dos dados de criminalidade do estado.

Hoje, tive uma surpresa ao ver que o Ministério da Justiça, aliado do governo do Rio, e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (respeitável entidade na área de segurança) reconhecem, em seu Anuário de Segurança Pública, que algo está errado com as estatísticas da Secretaria de Segurança fluminense.

Ao comentar as quedas nos homicídios entre 2009 e 2010, o Ministério da Justiça e o Fórum Brasileiro dizem que o estado do Rio de Janeiro, assim como Minas Gerais e Espírito Santo, apresentaram uma “piora” na qualidade de seus dados de criminalidade, “sendo agora classificados
como Estados com informações precárias em termos de qualidade e fidedignidade”.

Essa é a primeira vez que o Ministério da Justiça, aliado incondicional do governador do Rio, Sérgio Cabral, e de seu secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, reconhece um problema nos dados do Rio.

Segundo o Anuário, divulgado hoje, o Rio tem apresentado um elevado número de mortes violentas “sem intenção determinada”, o que desqualifica a suposta queda de homicídios apresentada por Beltrame e seus colegas da Secretaria de Segurança do estado.

A publicação rebaixa o Rio de Janeiro do Grupo 1 (dos estados com qualidade nas informações de criminalidade) para o Grupo 3 (dos estados cujos não são confiáveis), o mais baixo.

A descoberta de que o número de mortes “sem intenção determinada” (quando a morte não é classificada como homicídio, acidente ou suicídio) aumentara inexplicavelmente no estado do Rio de Janeiro desde 2007, início do governo Sérgio Cabral, foi feita por este blogueiro, em uma reportagem da Agência Brasil e em um post neste blog, publicados em maio deste ano.

Alguns meses depois, o espetacular fenômeno de redução dos homicídios às custas do aumento de mortes “sem intenção determinada” no Rio foi alvo de uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O Ipea alertou que algo estava errado nas estatísticas do Rio e calculou, com base em padrões estatísticos, que o Rio deveria ter algo em torno de 8 mil homicídios, em 2009, em vez dos 5 mil e poucos divulgados pela Secretaria de Segurança fluminense.

A suposta queda dos homicídios no estado do Rio de Janeiro é usada pelo governo do Rio para justificar um suposto “sucesso” de suas políticas de segurança pública, em especial as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP).

Mas, se os dados que justificam esse “sucesso” na mágica gestão de Beltrame não puderem ser considerados “fidedignos”, então a prova da eficácia da política de segurança pública vai por água abaixo.

Àqueles que consideram Beltrame o “grande gestor público do século”, peço que, antes de o elevarem ao Panteão dos deuses da segurança pública, analisem o fato de que o “sucesso” do secretário jaz numa farsa estatística.

Quem está promovendo essa farsa, se a polícia, seu Instituto de Segurança Pública ou o próprio governo, isso, infelizmente, ainda não se sabe. Mas isso também rende uma investigação e responsabilização dos culpados.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Juiz quer acabar com festa em presídio cinco estrelas da Polícia Militar

A Justiça do Rio de Janeiro determinou a transferência de oito presos do Batalhão Especial Prisional (BEP) da Polícia Militar para o presídio de Bangu 8. Segundo o juiz Murilo Kieling, do 3º Tribunal do Júri da capital, o BEP, que funciona como casa de custódia para policiais militares presos, não tem um controle administrativo dos detentos e permite regalias aos internos, como festas, telefone celular, bebida alcoólica e horário especial para visitas.

Segundo o juiz, a incapacidade do BEP de controlar seus detentos ficou comprovada quando foi solicitada, ao comando do batalhão, uma lista com os nomes dos presos à disposição do 3º Tribunal do Júri. O comando do BEP teria respondido o ofício informando que não havia nenhum detento nessa situação, o que, segundo a Justiça, não é verdade.

De acordo com a Justiça, o BEP tampouco informou ao tribunal sobre a fuga de dois presos considerados perigosos: Carlos Ary Ribeiro, o “Carlão”, e Franklin Delano Roosevelt Maia Júnior. O juiz Murilo Kieling só tomou conhecimento das fugas pela imprensa.

Procurada pela Agência Brasil, a Polícia Militar informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que não comenta decisões judiciais.

ps.: Em tempos de "pacificação" e de "deificação" de José Mariano Beltrame (quando toda a imprensa se desmancha em elogios ao "herói" José Mariano Beltrame e o cita como exemplo de um "gestor excepcional"), onde está a política de segurança do estado? Todos sabem, há anos, que o BEP (assim como o antigo Ponto Zero) é uma palhaçada. Que ações o governo do estado tem tomado para sanar o problema? Cade o "gestão revolucionária da segurança pública" de Beltrame, como diz a Revista Época dessa semana?

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Associação de Moradores do Vidigal diz que não quer só polícia e espera intervenções urbanístico-sociais

A Associação de Moradores do Vidigal critica o abandono por parte dos governos, diz que não quer “só polícia” e reivindica intervenções urbanísticas e sociais na comunidade. O Morro do Vidigal é uma das três comunidades, junto com a Rocinha e Chácara do Céu, que foram ocupadas pela polícia no início desta semana, para a implantação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).

“A comunidade está abandonada há 20 anos. O Favela-Bairro [antigo projeto de urbanização da prefeitura do Rio] passou por aqui há 20 anos e não teve nenhuma manutenção. Só teve coisas paliativas, como tapa-buracos ou a troca de lâmpadas. Com tanto tempo de abandono, aqui falta quase tudo, transporte, saneamento, educação, saúde”, disse o presidente da associação, Wanderley Ferreira.

Segundo ele, os principais problemas são saneamento e riscos de deslizamentos de encostas. “Temos muito esgoto a céu aberto. E isso está prejudicando a comunidade. Também há algumas áreas com risco de deslizamento, por isso também precisamos de obras de contenção”, disse.

O Vidigal, diferentemente da Rocinha, não foi beneficiado com obras da primeira fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A expectativa é que a segunda fase do PAC (PAC 2) seja levada à comunidade.

A OCUPAÇÃO

A ocupação das comunidades da Rocinha, de Vidigal e da Chácara do Céu, na zona sul do Rio de Janeiro, será mantida temporariamente pelos Batalhões de Choque e de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar, até que seja instalada a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) nesses locais.

O Bope ficará encarregado da Rocinha, a maior das três favelas. Já o Batalhão de Choque, que pela primeira vez coordena uma ocupação pré-UPP, ficará responsável pelas comunidades do Vidigal e da Chácara do Céu, favelas que ocupam o mesmo morro, mas que são bem menores.

De acordo com o comandante do Batalhão de Choque, coronel Fábio Souza, a ocupação do Vidigal e da Chácara do Céu será mantida com 60 homens, até que a UPP seja instalada. O oficial garante que a ocupação não prejudicará o trabalho primordial do batalhão que tem, entre suas funções, a segurança de estádios, a escolta de dinheiro do Banco Central e o controle de conflitos e manifestações.

Segundo ele, o Batalhão de Choque tem mais 60 policiais aquartelados, que podem agir em caso de necessidade. “Se houver necessidade, posso convocar homens que estão de folga”, disse o comandante. O coronel Fábio Souza não disse, no entanto, quando a UPP será instalada nessas três comunidades.

*Reportagem publicada na Agência Brasil

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Considerações sobre a ocupação da Rocinha

A ocupação da Rocinha tem merecido espaço considerável na mídia nacional, nos últimos dias. Até mesmo em canais internacionais, como a rede de TV americana CNN. Afinal, a ocupação da Rocinha é, para os cariocas, tão simbólica quanto a do Complexo do Alemão, em virtude da grande quantidade de notícias negativas surgidas nessas favelas em anos passados.

A Rocinha nunca foi tão violenta quanto o Complexo do Alemão. Mas quando episódios de violência ocorriam na favela, como as esporádicas operações policiais ou as sucessivas tentativas de invasão por quadrilhas rivais, principalmente nos anos 2004 e 2005, as notícias estampavam capas de jornais e revistas e ocupavam espaços consideráveis nos telejornais.

O motivo é simples: a Rocinha localiza-se num dos bairros com metro quadrado mais caro do Rio, São Conrado, e fica inconvenientemente posicionada sobre a principal via de ligação do bairro nobre da Barra da Tijuca com os mais nobres ainda Leblon, Gávea e Lagoa.

Tiroteios, que eram e continuam sendo comuns em várias partes do estado do Rio de Janeiro, tornavam-se, para a imprensa e o governo, inaceitáveis quando atingiam o carro de um morador que paga “IPTUs altíssimos” e “compra os produtos anunciados nos jornais e nas TVs”. Ou simplesmente quando, de tão intensos, os confrontos provocavam o fechamento do túnel que passa sob a Rocinha e impediam esses cidadãos de “primeira classe” a chegar em casa ou no trabalho.

A ocupação da Rocinha pela Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) era certa, até mesmo antes da acidental ocupação do Complexo do Alemão. Era uma demanda contínua da imprensa e dos moradores da zona sul.

Sua ocupação só demorou porque a Secretaria de Segurança estava juntando know-how suficiente para lidar com uma favela daquelas dimensões. A política de instalação das UPPs começou por favelas menores e mais fáceis de controlar (com exceção da Cidade de Deus, que a Secretaria de Segurança provavelmente se arrepende de ter ocupado tão cedo, no início de 2009).

Um erro na Rocinha provocaria a cabeça do secretário de Segurança e talvez até do governador Sérgio Cabral. Não cabia ali um laboratório como o que foi feito no Dona Marta ou no Chapéu Mangueira/Babilônia. Ao entrar na Rocinha, a polícia teria que ter experiência suficiente para que nada desse errado.

A Rocinha provavelmente seria ocupada depois da finalização do cinturão de segurança da Tijuca/Centro da cidade. Nos meus cálculos, a Rocinha seria ocupada entre o segundo semestre deste ano e o primeiro semestre de 2012.

Mas aí, nesse meio tempo, veio a ocupação do Complexo do Alemão, algo que a Secretaria de Segurança foi obrigada a fazer, sem muito planejamento, no final de 2010, depois do caos que bandidos daquela comunidade instauraram nas ruas do Rio de Janeiro. A “pacificação” do Alemão foi uma resposta das autoridades para a violência que eles não tiveram a capacidade de evitar.

O Alemão foi ocupado no meio do processo de pacificação da Tijuca, no meio da ocupação do Morro dos Macacos (outra favela simbólica) e antes das favelas São João/Matriz, Mangueira/Tuiuti e os complexos de São Carlos e Rio Comprido.

Tão logo essas favelas menores fossem concluídas, era certo que a Rocinha e o Vidigal, últimos grandes bastiões da criminalidade na zona sul seriam alvos da UPP.

Mas o Alemão complicou as coisas, porque exigiu a formação, a toque de caixa, de mais de dois mil novos policiais militares, ao mesmo tempo em que se formavam PMs para as UPPs da Tijuca e Centro.

Diante de tamanho pepino, era esperado que a Secretaria de Segurança não ocupasse a Rocinha tão cedo. Pelo menos, não pelos próximos meses. Afinal, a UPP da Rocinha vai exigir um efetivo semelhante ao do Alemão (cerca de dois mil homens). Será preciso tempo para formar tantos homens.

Então, era de se esperar que a Secretaria de Segurança só ocupasse a Rocinha a partir de março de 2012, quando os policiais militares começassem a substituir o Exército no Complexo do Alemão, liberando a força armada para atuar em outra ocupação de longo prazo.

Segundo o Estado-Maior da Polícia Militar, hoje há 1.500 policiais militares formados, esperando para começar a atuar nas Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). Contando que outros 1.200 policiais foram formados para atuar em outras UPPs instaladas neste ano, a PM conseguiu formar,no máximo, 2.700 homens para as UPPs em um ano.

Para formar os outros 700 policiais que faltam para ocupar o Complexo do Alemão e mais os 2 mil da Rocinha, serão necessários mais 12 meses. O que me leva a crer que a UPP da Rocinha só deverá ser inaugurada a partir de novembro de 2012 (se nenhuma outra favela for ocupada nesse meio tempo).

Nesse período, quem ficará ocupando a comunidade? O Exército? Os fuzileiros navais? Será o Bope e o Choque (que têm funções específicas dentro da estrutura da PM e não podem liberar tantos homens de suas funções primordiais para empreender uma ocupação de longo prazo)? Isso ainda não ficou muito claro. E a imprensa não parece estar muito preocupada com isso.

Quando fiz essa pergunta para o coronel Pinheiro Neto, chefe do Estado-Maior da PM, dentro do QG, na última semana, ele não me respondeu. Disse apenas que esse era um “desafio que ele teria que superar”. “Afinal, esse é a minha função, tornar possíveis essas operações”, respondeu-me o oficial, sem me esclarecer muita coisa.

Será que a opção da Secretaria de Segurança será inverter a ordem das ocupações? Destinar os primeiros 2 mil formandos para a UPP da Rocinha e fazer o Alemão esperar mais alguns meses pela instalação da Unidade de Polícia Pacificadora, aproveitando que o Exército já está no Alemão?

Nesse caso, a Rocinha poderia ganhar uma UPP logo nos primeiros meses de 2012. Nesse cenário, talvez a PM espremesse seu quadro de pessoal e fizesse uma força-tarefa meio precária, junto com a Polícia Civil, para fazer a ocupação temporária nesses próximos meses.

Mas nesse cenário, de ocupação meio precária, será que a Polícia conseguiria consolidar seu controle sobre o território, antes da chegada dos neófitos da UPP? O Exército está há um ano, com sua “mão forte” e sua doutrina de garantia da lei e da ordem, tentando, com 1.800 homens atuando quase em tempo integral, consolidar seu controle do Complexo do Alemão, sem sucesso. Tiroteios e assassinatos continuam ocorrendo no Alemão “pacificado”.

Com poucos meses de ocupação temporária, a polícia não conseguiu impor controle sobre as favelas dos complexos do São Carlos e do Rio Comprido, territorialmente bem inferiores à Rocinha. Hoje, os policiais da UPP precisam lidar com tiroteios rotineiros, já que bandidos continuam controlando porções dessas favelas, com o apoio de alguns segmentos da população e de policiais corruptos da própria UPP.
A Rocinha certamente não apresenta os desafios do Alemão. A favela da zona norte é maior, está localizada em área hostil (cercada por várias favelas ainda controladas por quadrilhas armadas). O número de acessos e vias de fuga do Alemão é muito maior do que os da Rocinha. A negligência dos governos com as favelas do subúrbio sempre foi muito maior do que com aquelas da zona sul. Historicamente, os episódios de violência no Alemão foram muito mais numerosos e contundentes do que aqueles da Rocinha.

No entanto, a polícia pode ter grandes problemas na Rocinha, sim. Principalmente, se fizer um trabalho de ocupação temporária (pré-UPP) apressado e pouco criterioso. A Rocinha é uma favela gigante, propícia à formação de bolsões controlados por criminosos, é um ponto de vendas de drogas geograficamente bem localizado (e, por isso, extremamente lucrativo).

Por ser lucrativo, o ponto de venda de drogas pode atrair a cobiça de outros bandidos. A defesa desses pontos de venda de drogas, que nas UPPs costuma ser feito sem a ostensividade de armas, pode ser diferente na Rocinha. Para defender lucrativos pontos de venda de drogas, os bandidos podem ter que recorrer a mais armas e fazer mais uso delas (como nos Complexos do São Carlos e do Rio Comprido e como no Alemão).

Como disse, aqui neste blog, durante os primeiros dias de ocupação do Complexo do Alemão, é preciso esperar para ver. Não acho que a UPP da Rocinha será tão problemática, mas certamente não será um mar de rosas. A Secretaria de Segurança precisa ser muito criteriosa na preparação do terreno, antes da implantação da UPP, e precisa acompanhar muito de perto o andamento da UPP.

Não sei se o governo do Rio resolveu antecipar a ocupação da Rocinha, visando melhorar sua imagem combalida diante de episódios recentes (a manipulação das estatísticas criminais, a violência nas favelas “pacificadas”, o assassinato do cinegrafista da Band, o exílio do deputado Marcelo Freixo) e buscando preparar terreno para a reeleição de Eduardo Paes à prefeitura.

Mas independentemente do motivo que levou o governo a apressar a coisas, é preciso ter cautela nesse processo de pacificação da Rocinha e não deixar que agendas políticas ditem o ritmo das ações de segurança pública.

De resto, desejo sucesso à UPP da Rocinha, e continuo cobrando da Secretaria de Segurança uma política de segurança mais ampla, que atenda a todo o estado do Rio de Janeiro (e as mais de 1.500 favelas fluminenses controladas por criminosos que não têm nem terão UPP) e não apenas a algumas favelas simbólicas.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Novo contingente assume Força de Pacificação do Complexo do Alemão com desafio de evitar ações violentas

O Exército trocou hoje (7) o comando e o contingente da Força de Pacificação dos Complexos do Alemão e da Penha, que atua nessas favelas da zona norte da cidade do Rio de Janeiro. Esta é a quarta troca de contingente do Exército, que ocupa a comunidade há cerca de um ano.

A 4ª Brigada de Infantaria Motorizada, de Juiz de Fora (MG), substituiu a 9ª Brigada de Infantaria Motorizada, que estava há 13 semanas no Complexo do Alemão. O novo comandante é o general Otávio Santana Rêgo Barros, que substitui o general Cesar Leme Justo.

Durante a missão da 9ª Brigada de Infantaria Motorizada, iniciada há três meses, o Complexo do Alemão vivenciou momentos de violência. Em setembro deste ano, um tiroteio no Morro do Adeus, que integra o complexo, exigiu um reforço no policiamento do local. Moradores disseram que uma adolescente de 15 anos morreu vítima de bala perdida.

Em outubro, criminosos encurralaram e atacaram policiais próximo ao teleférico do Itararé. Uma granada chegou a ser lançada contra os soldados da Polícia Militar, que também integram a Força de Pacificação.

Segundo o comandante militar do Leste (comando do Exército responsável pelo Rio de Janeiro), o general de Exército Adriano Pereira Júnior, não há como impedir que criminosos entrem nos complexos da Penha e do Alemão.

“Nada impede que alguém venha da Maré ou de outra comunidade aqui para dentro, que passe um dia aqui dentro fazendo contato e saia. Imagina, se nós cercarmos essas comunidades para controlar todo o acesso, o prejuízo que causaremos à população. Imagina se ficarmos trocando tiros aqui dentro, com o risco de termos efeitos sobre a população inocente”, afirmou.

O general afirmou, no entanto, que o Exército tem tentado evitar a ação desses criminosos. “Os traficantes estão sendo presos. Semanalmente, há apreensão de drogas feita aqui dentro. Na última ação agora, apreendemos pistolas, fuzis. Fizemos uma apreensão de armamento importante. Nossa inteligência está trabalhando. Se considerarmos o que era isso aqui antes, as escaramuças que têm havido aqui estão até abaixo do que eu esperava que iria acontecer”, disse.

*Reportagem publicada na Agência Brasil

Polícia Militar quer estabelecer critério para coberturas jornalísticas de operações policiais no Rio

O comandante da Polícia Militar do Rio de Janeiro, coronel Erir Ribeiro Costa Filho, disse hoje (7) que quer estabelecer um critério para coberturas jornalísticas de operações policiais nas favelas do estado. A afirmação foi feita um dia depois da morte do cinegrafista Gelson Domingos, da TV Bandeirantes, baleado durante uma operação policial na favela de Antares, na zona oeste da cidade.

“Vamos tentar reunir os sindicatos dos cinegrafistas, dos jornalistas, para conversar, para ter um critério de segurança. Quando um policial falar com um repórter: 'daqui vocês não podem passar’, que eles entendam e, por segurança própria, obedeçam a orientação dos policiais”, disse o comandante da PM.

A imprensa entrou na favela, durante a operação de ontem (6), junto com policiais do Batalhão de Choque e depois que o Batalhão de Operações Especiais (Bope) já havia ocupado a comunidade e a troca de tiros inicial tinha cessado. No entanto, quando os jornalistas já estavam nas ruas da Favela de Antares, o tiroteio recomeçou.

“O Bope entrou, mas os bandidos se deslocam [dentro da própria favela] e os policiais do Choque acabaram dando de frente com esses marginais. O policial vai entrando e eles [os bandidos] vão se deslocando para outros locais. Nesse caso, infelizmente [eles se deslocaram], para onde estava o cinegrafista”, disse.

Segundo o comandante, a polícia não “convida” a imprensa para cobrir as operações dentro das favelas, mas os jornalistas acabam acompanhando os policiais por conta própria. “A imprensa nunca foi convidada, só que o repórter, principalmente quem cobre a área policial, é um 'policial'. Infelizmente aconteceu isso [a morte] com esse nosso amigo”, afirmou.

Durante cerimônia da troca de comando da Força de Pacificação do Complexo do Alemão, o comandante militar do Leste, general do Exército Adriano Pereira Júnior, lamentou a morte do cinegrafista. “Rendo minha homenagem hoje ao cinegrafista morto da Band e esperamos que nosso trabalho [do Exército] colabore para que, fatos como esse, não se repitam no estado do Rio de Janeiro, nem no nosso país, ou seja, que profissionais exercendo a sua atividade percam a vida de forma brutal como foi o ocorrido ontem com o cinegrafista”, disse o general.

*Reportagem publicada na Agência Brasil

domingo, 6 de novembro de 2011

Morte de cinegrafista, baleado em favela no Rio, nos lembra que ainda falta muito para o Rio ser considerado "pacificado"

Acostumamo-nos a ver nos últimos meses, através da imprensa, a imagem de um Rio de Janeiro que está dando certo. São imagens de crianças apertando a mão de policiais em favelas "pacificadas" e de militares transitando supostamente tranquilos pelo Complexo do Alemão, reportagens sobre turistas visitando as áreas com UPPs, dados mostrando supostas reduções nos índices de criminalidade e elogios sem fim ao secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, e a seu chefe, o governador Sérgio Cabral, por terem dado uma solução à violência no estado.

São imagens que a imprensa e o governo querem (e têm conseguido) nos vender. Imagens de um Rio supostamente maravilhoso, que deixou para trás as marcas de um cotidiano de tiroteios, de assassinatos, de "bondes do mal", de traficantes sanguinários que mandam no estado. Vemos essas imagens diariamente no nosso noticiário e nos discursos das autoridades públicas federais, estaduais e municipais.

São imagens e informações que, repetidas à exaustão, dão a confortável impressão aos cariocas de que o Rio está vencendo a guerra contra a violência.

Mas se, por um lado, a propaganda do governo e da imprensa tem êxito em passar uma ilusória tranquilidade à população, essa mesma propaganda não é capaz, por razões óbvias, de acabar com a violência real, que ainda existe no Rio de Janeiro.

Rotineiras ocorrências de violência teimam em brigar com a propaganda do governo fluminense e insistem em continuar acontecendo no estado. São centenas de homicídios, milhares de ocorrências de roubo, inúmeras operações policiais desastrosas, vários tiroteios em favelas "pacificadas" ou não, relatos de bandidos que continuam mandando em centenas de comunidades do Rio de Janeiro, uma juíza assassinada por criminosos fardados, um deputado que deixa o país com sua vida ameaçada etc.

São ocorrências que, de maneira desconfortável, lembram os cariocas de que não moramos na Suíça, como certa vez, o secretário nos quis fazer crer. Nem estamos perto disso. Estamos muito mais perto de uma Colômbia, de uma Venezuela, de um México, do que de uma Suíça, de uma Noruega, de um Chile (sim, o Chile parece um país europeu, no que se refere a segurança pública).

Hoje, ao acordar, recebi a desagradável notícia de que um colega de profissão morreu baleado ao tentar reportar uma operação militar. O cinegrafista Gelson Domingos, da TV Band, morreu durante um tiroteio intenso, no meio de uma batalha, com um tiro de fuzil no peito. Ele não morreu na Líbia, na Somália, no Iraque ou no Afeganistão. A operação militar ocorria muito próximo da gente, em uma área residencial, na zona oeste da cidade do Rio de Janeiro: a favela de Antares.

A morte de Gelson não é chocante porque ele era um jornalista. A morte de Gelson é chocante porque ele foi vítima de uma arma de guerra, em meio a dezenas de tiros disparados a esmo, no meio de uma área urbana, na segunda maior cidade do Brasil. É chocante porque Gelson é apenas um dentre centenas de pessoas que morrem ou ficam feridas em ações policiais e tiroteios no Rio de Janeiro.

Sua morte é chocante, como são chocantes as mortes de cerca de 8 mil pessoas, que são assassinadas a cada ano no Rio de Janeiro.

É claro que sua morte me toca pessoalmente, porque também sou jornalista. E, como vários de meus colegas que cobrem ou cobriram operações policiais no Rio de Janeiro já relataram, isso nos leva a refletir sobre nossa profissão.

Já cobri algumas operações policiais na minha carreira, em áreas consideradas perigosas, como a Rocinha, a Maré e o Complexo do Alemão. Certa vez fiquei encurralado, a poucos metros de bandidos e policiais que trocavam tiros de fuzil, na favela da Chatuba da Penha. Foram cerca de 15 minutos de intenso tiroteio, daqueles em que é impossível calcular o número de disparos, ou saber de onde vêm os tiros.

Mas a morte de Gelson é mais do que isso. A morte de Gelson sintetiza o que vive o Rio de Janeiro. Continuamos sendo um estado e uma cidade tão violentos como éramos há cinco, seis ou sete anos.

Apesar de toda a bem sucedida propaganda do governo fluminense, empreendida com o lamentável apoio dos principais órgãos de imprensa cariocas, o Rio não está nem perto de ser pacificado.

Venho repetindo isso há meses. Pelo menos desde 2009, venho publicamente tentando convencer a todos (de forma incansável), que nossa política de segurança estadual (bem como a política federal) está equivocada.

Que a morte de Gelson sirva para que a população desperte, de vez, dessa ilusão. O Rio não está pacificado. O Rio está violento. Beltrame não é um herói, é apenas um secretário de Segurança que, como tantos outros que o antecederam, não tem conseguido reverter o cenário de violência do Rio de Janeiro.

Que a população acorde e cobre mudanças. Que deixe um pouco de lado as imagens massificadas de favelas sendo "pacificadas". Que passe a reparar nas mortes e ameaças a autoridades, nos milhares de homicídios de cidadãos fluminenses, na manipulação das estatísticas criminais, na corrupção policial, na corrupção governamental, nas centenas de favelas que não foram e nem serão "pacificadas", nas comunidades do subúrbio que vivem meses em guerra, nas escolas que não têm aulas por falta de segurança, nas ruas escuras em que não se pode circular por causa de assaltos, nas vítimas de balas perdidas, nas máfias de policiais que ampliam seu poder no estado, nas pessoas baleadas nas operações policiais...

Enfim, olhem a sua volta. Afinal, você está mais seguro?



Veja abaixo as últimas imagens de Gelson. É possível ver um vulto no canto esquerdo do vídeo (lado direito de quem está assistindo) do que parece ser o projétil que o atingiu, pouco antes de ele cair no chão com a câmera.